As flores
Leon Eliachar
Há dois meses que
Iracema recebia flores, sem cartão. Colocava tudo nas jarras, vasos, copos;
mesas, janelas, banheiro e até na cozinha. Quando o marido lhe perguntava por
que tantas flores, todos os dias, ela sorria:
— Deixe de
brincadeira, Epitácio.
Ele não percebia bem o
que ela queria dizer, até que um dia:
— Epitácio, acho bom
você parar de comprar tanta flor, já não tenho mais onde colocar.
Foi aí que ele
compreendeu tudo:
— O quê? Você quer
insinuar que não sabia que não sou eu quem manda essas flores?
Foi o diabo, ela não
sabia explicar quem mandava, ele não conseguia convencê-la de que não era ele.
— Um de nós dois está
mentindo — gritou, furioso.
— Então é você —
rebateu ela.
No dia seguinte, de
manhã, ele decidiu não sair, pra desvendar o mistério. Assim que as flores
chegassem, a pessoa que as trouxesse seria interpelada. Mas não veio ninguém:
— Já são duas horas da
tarde e as flores não chegaram, Epitácio. É muita coincidência.
Vai me dizer que não
era você.
Ele não tinha por onde
escapar. Insinuou muito de leve que a mulher devia ter conhecido alguém na sua
ausência. Ela chegou a chorar e se trancou no quarto. A discussão entrou pela
noite até o dia seguinte. Epitácio saiu cedo, sem mesmo tomar café. Bateu a
porta com força e levou o mistério para o trabalho.
Meia hora depois, a mulher
saiu e foi ao florista.
— Como vai, Dona
Iracema? A senhora ontem não veio, heim? Aconteceu alguma coisa?
À noite, Epitácio viu
as flores e não disse uma palavra, mas a mulher não parou:
— Seu cínico. Bastou
você sair para as flores aparecerem e ainda tem coragem de dizer que não foi
você.
Nessa noite ele teve
insônia.
Texto extraído do livro “O homem ao zero”,
Editora Expressão e Cultura – Rio de Janeiro, 1968, pág. 275.
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