Moinho de Sonhos
JOÃO ANZANELLO CARRASCOZA
A
mulher e o menino iam montados no cavalo; o homem ia ao lado, a pé. Andavam sem
rumo havia semanas, até que deram numa aldeia à beira de um rio, onde as
oliveiras vicejavam.
Fizeram
uma pausa e, como a gente ali era hospitaleira e a oferta de serviço abundante,
resolveram ficar. O homem arranjou emprego num moinho próximo à aldeia. A
mulher se juntou a outras que colhiam azeitonas em terras ao redor de um
castelo. Levou consigo o menino que, no meio do caminho, achou um velho cabo de
vassoura e fez dele o seu cavalo. Deu-lhe o nome de Rocinante.
Ao
chegar aos olivais, o pequeno encontrou o filho de outra colhedeira - um garoto
que se exibia com um escudo e uma espada de pau.
Os
dois se observaram à distância. Cada um se manteve junto à sua mãe, sem saber
como se libertar dela. Vigiavam-se. Era preciso coragem para se acercar. Mas
meninos são assim: se há abismos, inventam pontes.
De
súbito, estavam frente a frente. Puseram-se a conversar, embora um e outro
continuassem na sua. Logo esse já sabia o nome daquele: o menino recém-chegado
se chamava Alonso; o outro, Sancho.
Começaram
a se misturar:
-
Deixa eu brincar com seu cavalo?, pediu Sancho.
- Só
se você me emprestar sua espada, respondeu Alonso.
Iam
se entendendo, apesar de assustados com a felicidade da nova companhia.
Avançaram
na entrega:
- Tá
vendo aquele moinho gigante?, apontou Alonso. Meu pai sozinho é que faz ele
girar.
- Seu
pai deve ter braços enormes, disse Sancho.
-
Tem! Mas nem precisava, respondeu Alonso. Ele move o moinho com um sopro.
Sancho
achou graça. Também tinha uma proeza a contar:
- Tá
vendo o castelo ali?, apontou. Meu pai disse que o dono tem tanta terra que o
céu não dá para cobrir ela toda.
- E
se a gente esticasse o céu como uma lona e cobrisse o que está faltando?,
propôs Alonso.
-
Seria legal, disse Sancho. Mas ia dar um trabalhão.
-
Temos de crescer primeiro.
-
Bom, enquanto a gente cresce, vamos pensar num jeito de subir até o céu! -
disse Alonso.
-
Vamos!, concordou Sancho.
Sentaram-se
na relva. O cavalo, a espada e o escudo entre os dois. Um sopro de vento passou
por eles.
Já
eram amigos: moviam juntos o mesmo sonho.
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