MULHER QUE SE PREZA NÃO MENTE: INVENTA VERDADES
LEON ELIACHAR
Enquanto o homem inventa foguetes para ir à Lua, a mulher inventa
macetes para viver na terra. Sua capacidade inventiva a coloca entre os seres
mais evoluídos do mundo, incluindo nisso o próprio homem, ou melhor, alguns
homens, ou mais precisamente: o seu marido. Desde a maçã de Eva, até os tempos
de hoje, que a mulher não dá tréguas à sua mirabolante imaginação, criando, com
a sua inesgotável fonte de sagacidade, algumas das mais engenhosas invenções da
humanidade, como o bolo, a tia, o dentista, a irmãzinha menor, o telefone
enguiçado, o extravio, a cabeça lavada – e até mesmo o etc. O bolo foi
inventado para as situações difíceis. Para evitar o outro bolo, o posterior,
cujas consequências ela não pode prever, usa o primeiro. A tia foi inventada
para casos de doença, onde a mulher vai repousar. Mulher que passa o dia na
casa da tia não é vista por ninguém, mas em caso de desconfiança a tia é o mais
perfeito álibi que se possa imaginar. O dentista, que hoje evoluiu e tentou
tomar o nome de odontologista, mas que não pegou, porque a mulher que passa a
tarde toda na rua nunca vai ao odontologista, mas sim ao dentista, entre outras
coisas, tem a vantagem de tratar dos seus dentes. A irmãzinha menor serve de
pretexto, não só para evitar certos abusos de certos cavalheiros cuja companhia
ela adora para levá-la ao cinema, como inclusive para chegar cedo em casa,
deixar a irmãzinha – e sair de novo com o abusado de quem ela gosta. O telefone
enguiçado não passa de um telefone bom que a mulher põe fora do gancho e vai
pra casa da vizinha receber os telefonemas que lhe interessam – e só assim fica
livre daquele noivo chato que lhe telefona diariamente e não decide coisa
nenhuma. No dia seguinte, ela toma a iniciativa de reclamar do noivo. A falta
de consideração, pois ela de cama, sem poder levantar, e ele nem sequer um
telefonema – e não adianta explicar coisa nenhuma porque essa historia de dizer
que o telefone estava ocupado é uma chapa muito batida, pode perguntar pra
vovó, que ficou ao meu lado a noite inteirinha e ninguém nem pegou no telefone,
e o noivo, completamente desmoralizado, encontra a saída do então o seu
telefone estava enguiçado – e isso ainda rende uma cestinha de flores. O
extravio é o invento mais genial dos últimos anos porque antes mesmo do homem
inventar o correio, já ela – a mulher – havia bolado o extravio. Só assim ela
pode ir à praia, ao cinema, à sorveteria, à costureira, à manicure, não lhe
sobrando o mínimo tempo para escrever uma cartinha ao namorado que está fora –
e por mais que o homem conheça a mulher, não resta dúvida que ele conhece muito
mais o correio. A importância do extravio na vida de uma mulher é tão grande
que as estatísticas acusam anualmente um grande índice de juventude extraviada.
A cabeça lavada é um pretexto pra mulher não sair e passar a noite jogando
biriba com as amigas. Mulher que lava a cabeça todo dia, não tenha dúvida: é
viciada em jogo.
QUEM FOI?
Leon Eliachar (Cairo, 12 de
outubro de 1922
— Rio de Janeiro, 01 de junho de 1987) foi um jornalista
de humor e escritor brasileiro nascido
no Egito.
Veio para o Brasil muito pequeno
e viveu quase toda a sua vida no Rio
de Janeiro, onde morreu assassinado. Segundo notícias da época, ele foi
assassinado a mando de um rico fazendeiro paranaense com cuja esposa o autor vinha mantendo um romance.
Jornalista desde os 19 anos de
idade, trabalhou em diversos jornais e revistas, fixando-se, por último, no Última
Hora, onde mantinha uma página com o título de Penúltima Hora. Justificava
o nome da página com a legenda "um jornal feito na véspera".
Foi colaborador dos roteiros de dois
filmes carnavalescos,
e autor de programas de rádio e secretário da revista
Manchete.
Em 1956 foi laureado com
o primeiro prêmio na IX Exposição Internacional de Humorismo realizada na Europa, em Bordighera,
na Itália.
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